O Vedanta
Nove
aspectos fundamentais
por
Swami Vivekananda
Em uma das palestras que Swami
Vivekananda deu nos Estados Unidos ele disse: “Um sannyasi não pode
pertencer a qualquer religião, por sua vida de pensamento independente, o qual se
recolhe (afastando-se) de todas as religiões; esta é a vida de realização, não
uma mera teoria ou crença, muito menos um dogma”. Até mesmo chamar
Vivekananda de um ‘vedantista’ é colocar um rótulo nele injustamente.
O que então, pensarmos pelo Vedanta de
Sankarachaya ou de Ramanuja, ou ainda de qualquer outro acharya? Nós intencionamos enfatizar, alguma coisa indicada pela
palavra sânscrita darshana, a visão
especial de uma pessoa em particular. Nós desejamos esquematizar e discutir
aqui alguns dos nove pontos importantes os quais devem ser considerados
características especiais do Vedanta por Vivekananda.
Antes de fazermos
isso, deixe-nos primeiramente apontar o que parece ser erros frequentemente feitos no aproximar-se da vida e pensamento de
Swami Vivekananda. Se nós podemos clarear o solo destes erros preconcebidos,
nossos passos dentro da região de Vivekananda nos serão mais acertados.
Vejamos, então,
alguns dos tópicos:
1- que Vivekananda algumas vezes
foi infiel ao que Sri Ramakrishna ensinou: sua mensagem parecer ser totalmente
diferente.
Réplica: em primeiro lugar, o mestre jamais
ensinou a Narendra que ele teria que ser um ‘clone’ de si. Ramakrishna
demostrava com frequência respeito à amplitude e nível das mentes de seus
discípulos. Em segundo, deve ser lembrado que eles tinham ouvintes muito
diferentes. Ramakrishna falou para ocidentais instruídos, mas ainda com muitos
indianos por detrás, residentes de Calcutá, enquanto Vivekananda endereçou-se
ao público americano e europeu, produtos do renascimento e da ciência, bem como
da filosofia e teologia Ocidental. Em Vedanta, a mensagem é dirigida pela
natureza dos receptores.
2- que Vivekananda pegou seu
humanismo, socialismo, métodos de organização, etc., da sua experiência no
Ocidente.
Réplica: ao ler sua vida em detalhes alguém
logo descobre que ele havia estudado, e pensando, sobre as ideias de Hamilton,
Herbert Spencer, Tyndall, T. H. Huxley, e outros, e como ele os costumava
utilizar, antes dele retirar-se para o Ocidente. Ele fora, mesmo nos seus dias
de escola, familiar com filósofos como Hume e Hegel, e um ávido leitor de John
Stuart Mill.
3- Que ele fora ‘apenas’ o mensageiro
do Mestre, não um poder espiritual em si mesmo
Réplica: coisa alguma pode ser favorecida
deste fato. Sri Ramakrishna deu a ele o poder acumulado pelo seu próprio
sadhana, em um dia decisivo em Dakshineswar, relembrado mais tarde: “Agora me tornei um mero faquir”. Vivekananda
também, convidado por um dos seus irmãos-discípulos, declarou
inequivocadamente: “Enquanto eu estiver
na Terra, Sri Ramakrishna estará atuando através de mim, não há dúvidas”.
Vejamos agora o
que deveremos chamar de os mais significantes e distintivos ensinamentos de
Vivekananda.
Ele costumava
sublinhar nove títulos:
1. Que unicamente a Verdade é Brahman
Isso difere um
pouco de Sankara: “Apenas o Brahman é
real; o mundo é falso”. Swami Vivekananda dizia que o nome mais proeminente
que o homem deu a Deus era Verdade. “Minha
missão”, ele disse numa entrevista em Londres, “é mostrar que religião está em tudo e é tudo”. Ele nos disse que o
drama, a música e a arte, por si mesmos, é religião; que qualquer canção, de
amor que seja, conduzirá à liberação de alguém, uma vez que “alma é canção”.
O mais
surpreendente, ele diz: “Num certo
sentido eu sou materialista, porque eu creio que há apenas o Uno. Isso é o que
o materialista quer que você creia; apenas que ele o chama de matéria e eu
chamo de Deus, Brahman”. Ele conhecia por experiência própria quando, após
o toque do seu Mestre, ele foi às ruas e viu que tudo diante dele era Deus.
Tanto por natureza, como por alma. “há
apenas um único indivíduo”, ele diz, “e
cada um de nós é esse”. Atma é Brahman.
2. A
realização final é a identidade com Brahman
Aqui ele nos
mostra a ortodoxia do Advaita. Nenhum acomodamento pode ser aceito. “Não pare até a meta ser alcançada!”,
ele encorajava. Qual é a meta? Que a identidade pura, alcançada apenas pelo
destemor - a qual é o porquê dele tanto falar de destemor, “Que Deus, pelo qual você tem procurado por todo o universo, é o tempo
todo você mesmo, não em um sentido pessoal, mas no impessoal”. E quando os
outros replicavam a Ramakrishna que isso soava como egoísmo, respondia, “Naren pode dizer isso”. “O eterno, o infinito, o onipresente, o
onisciente é um princípio, não uma pessoa. Você, eu e todos, somos
corporificações; que o princípio é mais do que a corporificação numa pessoa; a importância que ele tem, e tudo no final
será a perfeita corporificação deste, e assim tudo será um, como agora eles são
essencialmente...”. Ele nos dizia que nascemos monistas; nós não podemos
aliviar disto, porque nós sempre percebemos o Uno.
3. Todos os caminhos estão fundamentados
no Advaita e completos nele
Isso é o que nos
impede de sermos fanáticos: que o homem não vai do erro à verdade, mas da
verdade inferior à verdade superior. Quando Swamiji falava sobre Sri Krishna e
o Gita, ele advertia: “Vocês devem adorar
o Ser em Krishna, não Krishna como Krishna”. Ele mostrava que a natureza
todo-incluída do Advaita quando dizia que o Vedanta aceita o dualismo e todos
os sistemas que precedem o Advaita. Este é o solvente universal dentro do qual
todas as filosofias devem fundir-se no final. Isso não é um ‘incluivismo’ nem um triunfalismo como
algumas vezes é alegado. Apenas veja: “Sem
o Vedanta, toda a religião é superstição (incluindo o ‘hinduísmo’); com ele,
tudo se torna religião”.
4. Religião deve ser apresentada
racionalmente
Foi apenas isso
que Swami Vivekananda disse nas suas falas no Parlamento das Religiões em
Chicago, em 1893. Isso cativou os ouvintes, os quais estavam já cansados de
longos discursos emocionais, de preladores sectários. Por todos os quadrantes,
o Vedanta tem sempre prescrevido, sharavanam,
manamam, nididhyasanam, ouvir a
verdade, triturá-la, e meditar sobre ela; aqui estava Vivekananda não apenas
nos falando da sua própria fé, mas sobre todas as fés. Havia antes alguém feito
isso de algum modo? “Se a religião de
alguém é verdadeira”, ele apontava, “então
todas as outras devem ser verdadeiras”. “O que aconteceu uma vez na história
deverá acontecer novamente...”. Essa fora uma atitude científica. Ele dizia
que o estudo da religião pode e deve ser aspirado nas exatas mesmas bases da
busca de qualquer outra ciência. “Cada
religião invoca necessidade de ser julgada pelo ponto de vista da razão”, e
quando as pessoas contestavam dizendo que a “razão humana era fraca”, ele dizia
para elas, “um corpo de sacerdotes deve
mesmo ser fraco”. Ele ousava dizer para seus discípulos no principal
monastério na Índia, “Apenas aquelas
partes dos Vedas as quais concordam com a razão são aceitas como autoridade”,
e também os prevenia, com relação ao Guru, “Adorem
seus Gurus como Deus, mas não os obedeçam cegamente; ame-o com toda a sua
vontade, mas pensem por vocês mesmos”.
5. Toda a verdade deve tornar-se
disponível para todas as pessoas
“O
que eu desejo propagar”,
disse Vivekananta num palestra, “o ideal
de uma religião universal... é uma religião que seja equanimemente aceitável
por todas as mentes; ela deve ser equanimemente filosófica; equanimemente
emocional; equanimemente mística e equanimemente conduzir à ação... e este será
o ideal do aproximar íntimo de uma religião universal”. Particularmente,
murmurava isso dentro dos ouvidos dos seus seguidores indianos. “A mais poderosa verdade confinada dentro de
nossos Upanishads, em nossos Puranas, deve ser retirada de nossos livros;
retirada de nossos monastérios, das florestas, da propriedade de corpos
selecionados de pessoas e espalhada e transmitida sobre toda a Terra, até que
esta verdade seja como o fogo, ao redor de todo o país”. Ele disse, “O Advaita, não deve mais ser secreto... ele deve baixar-se a vida diária das
pessoas. Ele deve penetrar no palácio, saindo da caverna até a casa do
lavrador, ao mendigo... em todos os lugares. O oprimido, o sem casta e as
mulheres não mais devem ter medo. Deixe-se uma nova Índia surgir, do homem que
lavra à terra; a cabana do pescador, ao sapateiro, ao varredor de ruas...”. Em
Londres, Vivekananda fez esta predição:
“O poder da religião, alargado e purificado, está penetrando em cada parte da
vida humana... ele viverá em cada movimento nosso; penetrará em cada poro de
nossa sociedade, e será infinitamente mais um poder para o bem que tenha sido
alguma vez antes”.
6. Cada um deverá incorporar todas as
fases da verdade
Por isso Swami
não quis dizer que não há mais necessidade de especialistas; ele intencionava a
não-exclusividade. O que a atual era precisa é de pessoas maduras “Para Deus!”; ele costumava dizer que
todos os elementos da filosofia, misticismo, emoções e ação foram plena e equanimemente
apresentados! Este é o ideal de pessoa perfeita. “Cada um de lado só.... é limitado, e este mundo está quase lotado
destas pessoas de ‘um só lado’; com o conhecimento de apenas um caminho no qual
eles se movem; qualquer coisa mais é perigosa e horrível para elas. Tornar-se
equilibrado e harmonioso em todas as direções é a meta ideal de religião”.
Em ocasiões extraordinárias ele apontava seu Mestre como um exemplo disso, ex.:
“Isso foi dado para mim”, ele disse
em Madrasis, “para viver ardentemente como
um homem dualista; como um ardente Advaita, como um ardente Bhakta”. Como um Jñani, Swamiji
afortunadamente providenciou seu próprio bom exemplo: outro semelhante profeta
equilibrado é difícil de encontrarmos. Ele foi um mestre em declarar
perfeitamente as visões dos outros. Ele foi um músico, e no Ocidente teve
lições de pintura na língua francesa. “Nós somos de um novo tipo”, ele dizia aos
seus ouvintes; “algumas vezes vestidos
como um cavalheiro, nós estamos engajados em palestras; em outras vezes,
jogados de lado.. cobertos de cinzas, nós estamos mergulhados em meditação; em
austeridades nas montanhas e florestas”. Esta mesma ideia ele aplicou ao
modo de seu trabalho: “Eu não nasci”,
Swamiji assinalava, “para fundar mais uma
seita, em um mundo fervilhante delas”.
7. Todos os caminhos são feitos ativos
no serviço do homem com Deus
Suponha-se que
nós queremos fazer trabalho caridoso; no caso, o que Swami Vivekananda nos diz,
é: “Jamais se aproxime de qualquer coisa
exceto como Deus. Esse é o nosso privilégio de nos ser permitido ser caridosos,
por apenas assim podermos crescer. Os pobres sofrem para que talvez os possamos
ajudar; deixe-se o doador ajoelhar-se e dar graças; deixe-se o receptor
erguer-se e permitir. Sinta que o recebedor é alguém mais elevado. Você serve o
outro porque você é mais inferior do que ele, não porque ele está embaixo e
você está no alto”. A relação de tudo isso para sobrepor ao ego é óbvia. “Filosofia, Yoga e penitências ... todos
aqueles se constituem na religião de alguém ou de um país; fazer o bem para os
outros é a única religião universal”. Swami Vivekananda costumava dizer
para seus discípulos, “Conheçam isso com
certeza: aquele quem trabalhará será a coroa em minha cabeça. O que é a Índia,
a Inglaterra ou a América para nós? Nós somos os servos de Deus, que pelo
ignorante é chamado de HOMEN”.
Agora, se esta
atividade de servir é expressa através de todos os caminhos, então nós
novamente somos relembrados de nosso primeiro ponto: o drama, a música e a arte
são por si mesmos religião. O que Vivekananda pregou ele fez. Numa palestra
para ouvintes americanos em São Francisco, intitulada, “É o Vedanta uma Futura Religião”, ele confidenciou: “Vocês possuem um Deus pessoal. Neste
instante eu os estou adorando (em falar). Esta é a maior das orações”.
8. Que o homem é o fazedor de sua
religião
O que ele quis
dizer ‘por um homem’? Um ser humano, sem dúvida! “Grandes homens”, dizia Swamiji, “são aqueles quem constroem pontes para os outros, com o sangue do próprio coração”. Que a
austeridade desta era não é mais penitências em florestas e meditações, mas a
construção de caráter através do karma
Yoga; isso é o necessário hoje.
Que a Índia em
particular agora procura ter ‘músculos de ferro e nervos de aço’, aos quais
nada poderá resistir; os quais podem penetrar os mistérios do universo, e
realizar seus propósitos em qualquer forma, mesmo que signifique descer abaixo
do oceano e encontrar-se com a morte face a face. Citando ou parafraseando
algum verso de poesia, ele disse: “Nós
deveremos esmagar as estrelas ao átomo, e atordoar o universo. Voce não sabe o
quem nós somos? Nós somos os servos de Sri Ramakrishna!”. Algumas vezes pode
alguém sentir que Deus em Swamiji era a um Homem; “Homem leitura”, ele dizia,
“ele é um poema vivo”; isso não é humanismo. Isso tem uma definição mais ampla.
9. Adorar o
terrível
Este, de certo
modo, é o mais “pessoal” destas ênfases singulares na mensagem de Vivekananda.
Ele costumava dizer, quando falava de Kali Devi, que Ela, quem primeiramente ele
não pode aceitar, tinha se tornado o poder que agora o movia. “Dois ou três
dias antes de Sri Ramakrishna abandonar o corpo, Ela, como ele costumava chamar
Kali Devi, entrou em seu corpo. É Ela quem entrou em mim aqui e me faz atuar...
eu sinto que este Poder está me dirigindo constantemente”. À parte de ser
pessoal para ele, de que modo isso é uma prescrição para nós? “Cada um é responsável pelo mal em cada
lugar do mundo”. Ninguém pode, realmente, “fechar a porta onde o mal reside”; todos tem que encarar,
eventualmente, o Ser, em cujas mãos segura o bem e o mal, a doçura e terror. Ela,
a sempre Mãe imparcial; foi o ideal escolhido por Ramakrishna, e que Swami
Vivekananda obrigou-se a trazer o significado disso e transmitir isso ao mundo.
“Adoração ao terrível” significa para
ele e para nós, não temer mesmo a morte; a ver no mundo de hoje o tremendo jogo
da energia, mostrando seu esplendor em cada caminho; entendendo-o como o Poder
de Brahman em si mesmo.
om tat sat